26/05/21
O Conselho Federal de Biologia (CFBio) encaminhou Nota Técnica, nesta segunda-feira (24/05), aos membros da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CMADS) da Câmara dos Deputados referente ao Projeto de Lei nº 5010/2013. A matéria versa sobre o controle e a fiscalização da produção, manipulação, importação, exportação e comercialização de material genético animal e de clones de animais domésticos destinados à produção de interesse zootécnico.
De autoria da senadora Kátia Abreu (PSD-TO), a quem também foi encaminhada a Nota Técnica, a proposição foi aprovada no Senado Federal e, neste momento, aguarda apreciação na CMADS. No dia 12 de abril, o relator do projeto na Comissão, deputado Ricardo Izar (PP-SP), apresentou parecer por sua rejeição.
A fim de levantar possíveis impactos no exercício profissional de Biólogos e para a sociedade, o CFBio analisou o projeto em busca de propor alternativas para aprimorá-lo, visando ao melhor e mais avançado desenvolvimento da prática no País.
No documento, o Conselho Federal de Biologia reforçou sua posição favorável ao PL nº 5010/2013, com adequações no texto, “acreditando no potencial de desenvolvimento científico e econômico que a ação pode proporcionar ao País, respeitados critérios éticos e o papel do Poder Público como garantidor do exercício legítimo e seguro da atividade”.
Confira, a seguir, a Nota Técnica enviada pelo CFBio aos parlamentares:
NOTA TÉCNICA
Ref.: Projeto de Lei n° 5010, de 2013, que “Dispõe sobre o controle de material genético animal e sobre a obtenção e o fornecimento de clones de animais domésticos destinados à produção de animais domésticos de interesse zootécnico e dá outras providências”.
O projeto de lei, de autoria da Senadora Kátia Abreu, foi objeto de grande discussão no Senado Federal, sob a identificação de PLS 73/2007 e, atualmente, está sob análise da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos Deputados, à qual se incumbiu como Casa Revisora. Nesta, o projeto foi distribuído também às Comissões de Ciência e Tecnologia – onde recebeu parecer pela aprovação, do Deputado Walter Yoshi –, Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
A matéria versa sobre o controle e a fiscalização da produção, manipulação, importação, exportação e comercialização de material genético animal e de clones de animais domésticos destinados à produção de animais domésticos de interesse zootécnico.
Reconhecendo a pertinência da matéria, o Conselho Federal de Biologia debruçou-se a analisar e levantar seus impactos sobre o exercício profissional dos Biólogos do país e concluiu, em tempo, que o projeto é meritório de crédito e aprovação das nobres deputadas e nobres deputados, nos termos que aprofundamos a seguir.
Os estudos sobre clonagem animal ganharam propulsão a partir da segunda metade do século XX, cujo caso mais emblemático foi o da ovelha Dolly, em 1997, na Escócia, que representou a primeira clonagem de um mamífero adulto bem-sucedido. Quatro anos depois, o Brasil também apresentou seu primeiro clone animal, a bezerra Vitória, que viveu até 2011. Desde então, outros experimentos foram sendo desempenhados, com alguns casos de sucesso, desde camundongos a primatas não-humanos.
Muitos questionamentos têm sido suscitados a respeito da efetividade e pertinência desse tipo de prática nos laboratórios científicos. O primeiro deles refere-se às condições de saúde do animal clonado. Quando completou 6 anos, a ovelha Dolly passou a apresentar doença pulmonar progressiva, detectada até então somente em ovelhas de mais idade. À época, considerou-se que o indivíduo clonado teria a tendência de “envelhecer mais rápido”. Entretanto, estudos posteriores, inclusive dos próprios cientistas envolvidos na criação da ovelha Dolly[1], comprovaram que os óvulos utilizados na clonagem possuem a capacidade de recompor a estrutura dos telômeros (estruturas constituídas por fileiras repetitivas de proteínas e DNA não codificante que formam as extremidades dos cromossomos). Assim, por se tratar de um primeiro caso de clonagem, os estudos e experimentos posteriores foram essenciais para aprimorar os métodos e garantir melhores resultados nessa atividade de reprodução assexuada.
Ainda, considere-se que a clonagem animal vem sendo amplamente utilizada pela indústria no mundo, seja para preservar os melhores reprodutores, visando a multiplicação de animais de alto valor genético; para o melhoramento genético – produzir leva de bovinos e ovinos com mais carne, por exemplo – ou mesmo para atender ao desafio da alta demanda mundial de alimentos. Na pecuária e na agricultura, ela é utilizada desde, pelo menos, a década de 1980[2]. Sobre o consumo de carne de animais descendentes de clones, outrossim, o Instituto Friedrich Loeffler (FLI), da Alemanha, afirma que “os descendentes de animais clonados não sofrem de quaisquer problemas de saúde específicos”[3], estando seguramente aptos, portanto, para consumo humano, ainda que como insumo complementar para a demanda alimentícia nacional.
Assim, espera-se que, com o uso da inovação tecnológica e as melhorias buscadas nas cadeias de desenvolvimento de pesquisas genéticas na área, a difusão da clonagem animal possa alcançar tanto os grandes, como também os pequenos produtores. No Brasil a clonagem animal já é uma realidade. Como já mencionado, a o nascimento da bezerra Vitória representou não somente o primeiro caso bem sucedido de clone no Brasil, mas seu posicionamento como o primeiro país em desenvolvimento a dominar a tecnologia da clonagem. Nesta feita, os estudos sobre clonagem têm proporcionado parcerias científicas que podem se ampliar para outras esferas, mediante estudos de viabilidade.
Além disso, o Brasil,enquanto possuidor do maior rebanho bovino do mundo e o maior exportador mundial do produto, tem ainda mais a ganhar na fatia de participação no mercado mundial de venda de produtos agropecuários, caso consiga otimizar e pulverizar a clonagem em nível doméstico. Entretanto, é preciso reconhecer que para o robustecimento dessa prática, é necessária não somente a sua legalização, já conseguida no Brasil por meio da Lei nª 11.105/2005 (Lei de Biossegurança), mas também a sua regulamentação, para garantir segurança jurídica aos que a desenvolvem e a quem dela se beneficia, direta e indiretamente.
Assim, reconhecemos o mérito e importância do estímulo seguro e bem orientado que a regulamentação da clonagem animal no Brasil tem potenciais de trazer, nos termos do referido Projeto de Lei, ainda mais considerando a responsabilidade que este evoca ao Poder Público de controle e fiscalização direta da prática, de modo a garantir segurança para os produtores e pesquisadores envolvidos, e o correto e legítimo desempenho dessa atividade no País.
Nesses termos, manifestamo-nos pela aprovação do projeto de lei, submetendo à consideração dos nobres deputados e deputadas as ressalvas que sugerimos a seguir, visando o seu aprimoramento e o melhor e mais avançado desempenho da prática no País:
Art. 3º A inspeção e a fiscalização ficarão a cargo do órgão competente do Poder Público federal e deverão considerar os aspectos industrial, higiênico-sanitário, de identidade, de propriedade, de sanidade, de segurança, de desempenho produtivo, de fertilidade, de eliminação ou, no quanto possível, minimização do sofrimento e maus-tratos aos animais, e de viabilidade do material genético animal e dos clones de animais domésticos, sem prejuízo de outros aspectos definidos em regulamento, destinados à produção de animais domésticos de interesse zootécnico.
art. A atividade de clonagem animal, de que trata esta Lei, será considerada de caráter multiprofissional, garantida a execução de pesquisas, desenvolvimento, produção, manejo, recuperação, gestão, fornecimento e controle de qualidade por profissionais biólogos, veterinários, zootecnistas, engenheiros agrônomos e todos os demais profissionais competentes.
Conclusão: reforçamos, diante das exposições elencadas acima, a posição favorável do Conselho Federal de Biologia ao Projeto de Lei nº 5010/2013, com as adequações no texto também propostas, acreditando no potencial de desenvolvimento científico e econômico que a ação pode proporcionar ao País, respeitados critérios éticos e o papel do Poder Público como garantidor do exercício legítimo e seguro da atividade.
Certo da consideração de Vossas Excelências aos apontamentos que ora expomos nesta Nota, este Conselho Federal de Biologia se coloca à total disposição para debates e demais detalhamentos que as Senhoras e Senhores parlamentares entenderem necessários.
Brasília, 24 de maio de 2021.
[1]Sinclair, K., Corr, S., Gutierrez, C. et al.Healthy ageing of cloned sheep. Nat Commun7, 12359, 2016. Disponível em <https://doi.org/10.1038/ncomms12359>. Acesso em 07/05/2021.
[2]COSTA, Sérgio Ibiapina Ferreira; DINIZ, Débora. Mídia, clonagem e bioética. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 16, n. 1, p. 155-162, Jan. 2000. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2000000100016&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 10/05/2021.
[3]Disponível em <https://www.terra.com.br/noticias/ciencia/e-perigoso-comer-carne-de-animais-clonados,5ec2ee46ae8841f6ffbb677082bdf0a1gezmRCRD.html>. Acesso em 05/05/2021.
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