25/02/19
A sala de jantar do médico Luiz Cláudio Stawiarski está tomada por insetos. Sobre a mesa, quadros entomológicos exibem as mais variadas formas de aranhas, besouros e libélulas. Um móvel de madeira posicionado ao lado da mesa reúne gavetas de borboletas e mariposas. Ao todo, são 2 mil insetos que, neste sábado (23), foram doados ao Museu Nacional do Rio de Janeiro para ajudar na reconstrução do acervo, destruído por um incêndio de grandes proporções, em setembro do ano passado.
“Vejam, borboletas de asas verdes, elas são muito raras. E esta, a maior espécie de mariposa encontrada no Brasil”, diz Luiz Cláudio, enquanto exibe orgulhoso a coleção. Ele é filho de Victor Stawiarski, professor de biologia, que por 30 anos, a partir de 1940, deu aula no Museu Nacional. Os insetos, paixão do pai que faleceu em 1979, foram coletados tanto pelo pesquisador quanto pelo médico no Rio de Janeiro, Paraná e Pará. O acervo têm hoje, portanto, entre 30 e 40 anos.
O material que está na casa do médico era usado pelo pai nas aulas que dava. Além desses, o biólogo havia coletado centenas de outros, que faziam parte do acervo do Museu Nacional. “Foi a minha filha que deu a ideia de fazer a doação. Aqui, o material ficava guardado, tudo bagunçado. Não vou dizer que ele vai voltar para o lugar de onde não deveria ter saído, porque se não tivesse saído, teria queimado”.
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A doação será feita no nome do Victor Stawiarski: “Certeza que de onde ele estiver, ele estará feliz com isso”. Luiz Cláudio conta que, por meses, dedicou-se a organizar o material. Colou partes quebradas e reposicionou alfinetes que haviam se soltado do isopor da base dos quadros e gavetas.
Amor aos insetos
O principal objetivo de expor os insetos é despertar o amor à natureza. “Quem conhece, respeita. Meus filhos nunca mataram um bicho. Se acham um inseto, vão soltar lá fora. Você passa a se sentir mais um ser vivo, não é superior a ninguém”, diz.
Ao lado do marido, Luiza Stawiarski, concorda. Professora aposentada, ela fez cursos com o sogro, no Rio de Janeiro. Dele, ganhou dois quadros. O preferido exibe insetos que se camuflam na natureza. Entre eles, uma borboleta com olhos de coruja nas asas e outras com asas que imitam folhas secas. “Elas têm inclusive partes que parecem folhas quebradas”, mostra Luiza. Os quadros também serão doados.
O preferido de Luiz Cláudio é outro, o dos besouros: alguns grandes, quase do tamanho de um punho fechado, e outros pequenos, menores que a falange de um dedo. O que encanta neles, explica o médico, não é a armadura, mas a leveza que escondem. “Você custa a imaginar que eles possam voar. A parte de fora parece uma armadura. Mas quando levanta, você vê a asa, fininha. Isso é um contrassenso, como é que se sustenta?”, intriga-se.
Referência internacional
Segundo a professora do departamento de entomologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Marcela Monne, o acervo de insetos do Museu Nacional era referência no país e internacionalmente. Não há um número exato de insetos, mas a estimativa é de que a coleção reunia entre 5 e 10 milhões de peças. Apenas uma pequena parte escapou do incêndio, 42 mil exemplares de moscas e mosquitos.
Foi com Marcela que Stawiarski entrou em contato para fazer a doação. A professora explica que o acervo doado, quando chegar ao Rio de Janeiro, será analisado quanto a qualidade e deverá ser disponibilizado como acervo científico, usado para pesquisa. Amanhã, um caminhão do Museu Nacional buscará o material na casa de Luiz Cláudio e a viagem será feita por terra.
“As doações têm vindo não só de insetos, mas de materiais, como alfinetes, que precisamos para a reconstrução do acervo”, conta a professora. Outras pessoas que desejem doar algum acervo de interesse da instituição podem entrar em contato com o Museu pelo site. Outro canal para doações é via Sociedade Brasileira de Zoologia, que incentiva instituições nacionais a doarem exemplares de suas coleções.
Desde o incêndio, Marcela conta que recebe mensagens de pessoas que querem aprender a coletar insetos para ajudar a reconstruir o acervo. Ela esclarece, no entanto, que a coleta não pode ser feita por amadores. Para isso, é necessário ter autorização do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. “O pesquisador só recebe autorização para coletar o animal ou a planta com a qual ele trabalha, [na área] em que é especialista”, explica.
Por Mariana Tokarnia – Repórter da Agência Brasil / Brasília