11/04/23
O Conselho Regional de Biologia da 5ª Região (CRBio-05), diante dos recentes incidentes com tubarões em Pernambuco, reuniu alguns Biólogos que atuam na área para emitir uma nota defendendo a criação de uma força-tarefa que envolva seis eixos – a prevenção, a fiscalização e o investimento em pesquisas, recuperação ambiental, campanhas educacionais e em infraestrutura para manter o equilíbrio ambiental e a segurança dos banhistas.
No intervalo de 15 dias, foram registrados três casos na Região Metropolitana do Recife, sendo um em Olinda e dois em Piedade, Jaboatão dos Guararapes. O primeiro registro ocorreu na praia de Del Chifre, em Olinda, no dia 20 de fevereiro, com o surfista André Luiz Gomes, de 32 anos. Ele passou por cirurgia na perna e se recupera em casa.
Os outros dois casos foram com os adolescentes Claudemir Gleybson Ferreira, de 14 anos e Kaylane Timóteo Freitas, 15 anos. Os incidentes ocorreram em dois dias seguidos, no domingo (5/3) e segunda-feira (6/3). A garota teve uma parte do braço esquerdo arrancado e recebeu alta hospitalar uma semana depois. O garoto teve a perna direita amputada e segue internado. Com isso, subiu para 77 o número de ocorrências envolvendo tubarões em Pernambuco, desde 1992.
APORTE FINANCEIRO
Com o alvoroço provocado pela volta dos incidentes nos últimos dias, o Governo de Pernambuco anunciou um aporte de R$ 2 milhões para investimento em pesquisas. Aí é importante fazer uma contextualização. A Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), através do Departamento de Pesca, desenvolveu durante duas décadas, de 1994 a 2014, um trabalho de pesquisa voltado para elucidar a causa desses incidentes com tubarões na costa pernambucana. Porém, o trabalho foi interrompido.
“Nesse período, algumas informações inéditas vieram à luz. Duas espécies foram confirmadas através de fragmentos dentários: cabeça-chata (Carcharhinus leucas) e tigre (Galeocerdo cuvier). Não podemos, entretanto, descartar outras espécies, como o galha-preta (Carcharhinus limbatus), muito comum na Flórida (EUA) e que é o maior responsável pelos incidentes naquele lugar, e tem sua ocorrência registrada na área de Pernambuco. Mas a pesquisa foi interrompida pelo Governo do Estado em razão dos excelentes resultados obtidos com o PROTUBA, pois os incidentes reduziram com as campanhas de conscientização com a população e se imaginou que não era mais preciso se preocupar com esses incidentes com tubarão”, enfatizou a Bióloga Danielle Viana (CRBio 59.950/05-D), Doutora em Oceanografia e Pesquisadora do Departamento de Pesca e Aquicultura da Universidade Federal Rural de Pernambuco.
Os resultados obtidos pelo PROTUBA até 2004 mostraram que nos períodos sem o monitoramento realizado pelo barco Sinuelo (32 meses) ocorreram 17 incidentes, equivalendo a uma média de 0,531 incidentes/mês, enquanto nos 91 meses com a operação de captura em curso, foram registrados 3 casos, equivalendo a uma média de 0,033 incidentes/mês, indicando uma redução na ordem de 17 vezes, ou cerca de 95%.
Dos 77 casos registrados em Pernambuco desde 1992, 10 foram no Arquipélago de Fernando de Noronha e 67 na Região Metropolitana do Recife, sendo 60 em um trecho considerado o mais crítico: da Praia do Pina, no Recife, até a Praia do Paiva, no Cabo de Santo Agostinho. E 15 destes casos foram na região conhecida como Igrejinha de Piedade, justamente onde ocorreram os dois últimos registros. Vale a pena destacar que a topografia ajuda na presença dos animais, pois existe um “canal” com profundidades variando de 4 a 12 metros, que se estende do Pina até os Arrecifes de Candeias, cerca de 20 km de extensão e que em alguns pontos, fica muito próximo à praia. Também existe uma correlação entre os incidentes com as fases da lua, nova e cheia, pois nessas fases lunares as marés são máximas, o que propicia que tubarões de maior porte se aproximem da linha de praia.
RECUPERAÇÃO AMBIENTAL
Os Biólogos acreditam que, se algumas medidas de recuperação ambiental tivessem sido adotadas, bem como a avaliação da condição do Rio Jaboatão e uma análise mais profunda dos resultados alcançados com o afundamento de rebocadores e o desenvolvimento de projetos na área da conservação, por exemplo, poderiam auxiliar na diminuição da degradação ambiental generalizada que se instalou nos ambientes costeiros.
EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Nessa retomada dos trabalhos de pesquisa, o uso dos receptores acústicos será importante para fazer esse mapeamento e um monitoramento dos tubarões na região. Entretanto, os Biólogos sinalizam que será preciso aproximadamente um ano para se ter algum resultado. Por isso, a Educação Ambiental se torna um mecanismo de ação mais rápido.
“A prevenção é o que a gente mais precisa trabalhar, evitando o encontro entre o peixe e o ser humano por meio de campanhas de Educação Ambiental. Lembro do eterno professor Fábio Hazin, que passava isso como muita segurança e propriedade. Ele foi pioneiro em trazer tudo o que Pernambuco sabe sobre tubarões, através do projeto de pesquisa, monitorando os animais e os guiando para outro local, para fora da área de conflito. Temos que lembrar que o ambiente é dele, do animal. A gente detonou durante muito tempo e um dia a conta iria chegar. O local onde ele caçava e se alimentava, por exemplo, não existe mais (por conta da construção e dragagem do Porto de Suape)”, destacou o Biólogo e professor André Maia (CRBio 107.742/05-D), Especialista em Paisagismo e em Gestão Ambiental.
“Os tubarões desempenham um papel fundamental para o equilíbrio do ecossistema marinho. Nosso trabalho enquanto cientistas é reduzir o risco de incidentes através da instituição de medidas adequadas. Acredito que ampliando os esforços nas linhas de ação da Educação Ambiental, fiscalização e prevenção vamos conseguir sensibilizar a população e diminuir o número de futuros incidentes”, afirmou Danielle Viana, acrescentando também a importância de implementação de um projeto de lei que adote as ações de Educação Ambiental de forma contínua, mesmo com a alternância no poder.
INFRA-ESTRUTURA
Os Biólogos também apontaram a necessidade de se melhorar a infraestrutura das praias, com aumento do número de banheiros, chuveirões e estimular o uso de piscinas por barraqueiros nos pontos de maior risco dos incidentes. “Também poderíamos pensar na construção de um local físico e fixo que possa receber todo o material biológico proveniente das pesquisas, a fim de disseminar as atividades de Educação Ambiental, transformando-o em uma espécie de museu, como existe de forma privada em Fernando de Noronha”, finalizou Danielle Viana.
INTERDIÇÃO
O CRBio-05 acredita que a interdição provisória dos trechos onde os incidentes são mais recorrentes, ideia defendida por alguns profissionais, seria o último caminho. Ressalta-se ainda a necessidade de termos uma política pública de apoio aos comerciantes que tiram seus sustentos daquela área, como afirma o Coordenador da Comissão de Divulgação e Informação, o Biólogo Mário Luiz Farias Cavalcanti (CRBio 36.956/05-D).
Fonte: CRBio-05